A história da teoria das probabilidades está profundamente ligada a alguns dos mais brilhantes matemáticos da humanidade. Embora tenha começado com Girolamo Cardano e seu trabalho “Liber de ludo aleae” por volta de 1550, foi na França do século XVII que essa área da matemática deu um salto decisivo. Nesse contexto, surge o nome de Blaise Pascal, um gênio multifacetado que desempenhou um papel central na formulação das bases modernas da probabilidade.
O Cenário Inicial: Chevalier de Méré e a Motivação para Avanços
O ponto de partida para o envolvimento de Pascal com as probabilidades foi um problema prático apresentado pelo Chevalier de Méré, um nobre francês e ávido jogador. Méré, intrigado por questões relacionadas à divisão justa de apostas em jogos interrompidos antes do término, procurou Pascal em busca de respostas. O problema proposto era: “Como dividir as apostas entre dois jogadores, sabendo o número de pontos de cada um antes da interrupção do jogo?”
Apesar das ideias aritméticas rudimentares de Méré, foi a genialidade de Pascal que transformou a questão em algo maior. Entusiasmado pelo desafio, Pascal começou uma troca de correspondências com outro gênio matemático da época, Pierre de Fermat, culminando na criação da base teórica que fundamenta a teoria das probabilidades.
A Vida e o Brilhantismo de Pascal
Nascido em 1623, Blaise Pascal enfrentou desafios desde cedo. Órfão de mãe aos três anos, foi educado por seu pai, um intelectual de métodos pedagógicos nada convencionais. Preocupado com a saúde frágil do filho, seu pai decidiu que Pascal deveria iniciar os estudos de geometria somente aos 15 anos. Contudo, a curiosidade inata de Blaise falou mais alto: aos 12 anos, ele já estava recriando conceitos de geometria por conta própria, impressionando o pai, que decidiu presenteá-lo com o clássico Elementos, de Euclides.
O talento precoce de Pascal tornou-se evidente. Aos 14 anos, passou a frequentar reuniões científicas organizadas por Marin Mersenne, onde conheceu figuras ilustres como Descartes e Roberval. Apenas dois anos depois, publicou o “Essay pour les coniques”, uma obra que revolucionou a geometria projetiva.
Além de sua contribuição à geometria, Pascal também se destacou na criação de instrumentos. Aos 17 anos, para ajudar seu pai em cálculos fiscais, projetou uma máquina de calcular, a Pascaline, precursora das calculadoras mecânicas. Embora não tenha sido um sucesso comercial, a Pascaline representou um marco na história da computação.
Leia também…
👉Jacques e Jean Bernoulli: Gênios da Matemática
A Contribuição Decisiva de Pascal às Probabilidades
Foi em 1654 que Pascal voltou suas atenções à matemática, focando-se em duas frentes: a geometria das cônicas e a teoria das probabilidades. Apesar de não ter transformado suas correspondências com Fermat em um livro, as ideias discutidas influenciaram profundamente o campo.
Nesse mesmo ano, Pascal escreveu o Tratado do Triângulo Aritmético, explorando as propriedades dos coeficientes binomiais, fundamentais para os cálculos probabilísticos. Esse trabalho trouxe inovações como:
- Organização dos coeficientes binomiais no Triângulo de Pascal: Cada linha do triângulo representa os coeficientes da expansão de (a+b)n. Por exemplo, os coeficientes de (a+b)3 são 1, 3, 3, 1.
- Aplicações probabilísticas: A soma dos coeficientes em uma linha do triângulo representa o número total de possibilidades em experimentos probabilísticos. Para n=3, os coeficientes 1, 3, 3, 1 indicam:
- 1 possibilidade de obter 3 caras.
- 3 possibilidades de obter 2 caras e 1 coroa.
- 3 possibilidades de obter 1 cara e 2 coroas.
- 1 possibilidade de obter 3 coroas.
O Triângulo de Pascal, embora conhecido anteriormente na matemática oriental, tornou-se amplamente divulgado e associado ao seu nome devido à sistematização apresentada em seu tratado.

O Misticismo e os Últimos Anos de Pascal
Apesar de seu brilhantismo matemático, Pascal afastou-se gradualmente da matemática, motivado por uma profunda transformação religiosa. Ele dedicou seus últimos anos à meditação e aos escritos espirituais, voltando brevemente à matemática em 1658 para trabalhar na geometria da cicloide, movido por razões místicas.
Esse distanciamento faz de Pascal uma figura peculiar na história da matemática: um gênio que escolheu não empregar todo o seu potencial na ciência, mas que, mesmo com suas contribuições pontuais, deixou um legado inestimável.
O Legado de Blaise Pascal
A influência de Pascal transcende sua época. Suas ideias sobre probabilidades abriram caminho para outros gigantes, como Christiaan Huygens, que aprofundou o estudo da área, e para o desenvolvimento da estatística e da teoria dos jogos. Além disso, sua máquina de calcular antecipa a evolução tecnológica que culminaria na era digital.
Mais do que um matemático, Pascal foi um pensador versátil, capaz de unir ciência, filosofia e espiritualidade em suas reflexões. Sua trajetória demonstra que a curiosidade e o amor pelo conhecimento podem transformar até mesmo os desafios cotidianos, como dividir apostas, em grandes avanços para a humanidade.
Com sua genialidade e intuição, Blaise Pascal marcou seu nome na história, provando que mesmo questões práticas podem ser a semente de uma revolução científica.